O Cacique - lider tribal.

sexta-feira, agosto 20, 2010

A causa é constantemente modificada.


Depois há a questão das touradas. Sou contra as touradas e, para mim, as pessoas não deviam gostar de touradas, porque as touradas são más para os touros. O problema é que não consigo encontrar argumentos para proibir quem gosta de tourada de nutrir com o seu aplauso e dinheiro a tourada, nomeadamente quando observo que eu próprio não estou disposto a abdicar de um sem número de coisas de que hoje benefecio e que, objectivamente, provocam muito mais sofrimento aos animais. Há a questão do espectáculo, do prazer que as pessoas que gostam de tourada retiram por assistir a um percurso lento de dor de um animal até à sua morte. Admito que há aqui uma diferença, entre quem faz sofrer um animal porque se quer alimentar e aqueles que o fazem em nome de uma arte. Mas a questão talvez seja mais ou menos como a da bomba atómica: do ponto de vista do individuo japonês, morrer debaixo de uma explosão nuclear ou porque mil aviões depejaram 30 milhões de quilos de bombas incendiárias na minha cidade de madeira é absolutamente indiferente; a diferença só surge posteriormente, quando objectivos ideológicos impregnam a nossa maneira de olhar a morte e o sofrimento extremo. A vida de um touro de lide quando mal comparada com a de um porco de uma exploração dinamarquesa é o equivalente a mal comparar a vida de uma estrela rock que morre repentinamente aos 27 anos afogado num mar de conas com a de um miudo de 18 que morre no Afeganistão debaixo IED: ambos morrem cedo, mas enquanto um teve uma vida maravilhosa, o outro nem chegou a saber o que era viver.


Maradona

Comentário


Reforçando a argumentação deste post no "Cachimbo de Magritte".

Existe uma noção importante, que toda a gente está a ignorar: O que é o desemprego estrutural?

Façamos um pequeno exercício de abstracção antes de mergulhar de novo no assunto em discussão que é a liberalização/flexibilização das leis do mercado de trabalho.

O que é considerado "emprego" é a utilização de determinadas capacidades humanas com o propósito de criar algo que se pode denominar "valor". Esse valor pode ter diferentes propósitos, sejam egoísticos (ex. plantar couves para se alimentar), sejam altruísticos (ex. educar uma criança para esta se tornar auto-suficiente).

Ora, partindo desta noção KISS, o que é então o desemprego estrutural? É a incapacidade de um determinado indíviduo poder utilizar as suas capacidades para criar um determinado valor durante um período prolongado.

Considerando o que é afirmado no parágrafo anterior, muita gente afirma: Não interessa que valor está a ser criado, as capacidades são o vector que deve ser recompensado, não obstante esse valor eventualmente não ser útil aos restantes.

Incorre-se aqui num problema: Se i) não existe incentivo para alterar o valor que está a ser produzido com as capacidades do indivíduo, e se ii) é garantido que o valor inútil gerado é recompensado, então não vai existir a necessidade de adaptar as capacidades a um mundo em mudança.

Ou seja, a garantia de utilização das capacidades existentes acaba por destruir valor no todo da sociedade.

Saindo desta análise abstracta, qual é o impacto?

A garantia de um emprego para a vida estava intimamente ligada ao facto de o conjunto de capacidades que eram necessárias à criação de um determinado valor não se alterar no espaço de uma geração.

No entanto, pelas mudanças tecnológicas e sociais, existem dois tipos de capacidades que deixam progressivamente de ser necessárias:
1. trabalhos repetitivos -> substituídos por máquinas e automatismos
2. trabalhos tecnológicos e ciêntificos -> o acesso a informação leva a que conceitos e técnicas mudem mais rapidamente

Concluindo (deixarei os leitores continuar o argumento acima): Se queremos uma sociedade com acesso a um valor gerado correspondente a um maior output económico, ou seja à sociedade tecnológica tão presente nos discursos políticos de hoje em dia, é essencial que as capacidades se transformem de forma contínua. E isso implica forçosamente ou uma flexibilização de emprego, ou desemprego estrutural para as capacidades obsoletas. A alternativa é uma sociedade mais modesta, com menor pendor "tecnológico", mas que num mercado aberto pode, devido às disparidades na riqueza entre duas sociedades com diferentes modelos de desenvolvimento gerar conflitos.